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ESPECIAL CASSINO ULTRA RACE - FRANCISCO RAINONE

  • Francisco Rainone
  • 16 de nov. de 2015
  • 5 min de leitura

Sou educador físico, atleta e treinador da academia Cia Athletica de Poa, treino ultramaratonistas e corredores de montanha e tenho no currículo diversas ultramaratonas de 6, 12, 24 horas e provas de montanha.


Fiquei sabendo da Cassino Ultra Race através da atleta Magda Chagas experiente em provas de ultradistância, pesquisei sobre a prova que seria pioneira no Brasil e os organizadores pareciam muito responsáveis e atenciosos com os atletas e preocupados com sua integridade. Ta aí , esse seria meu maior desafio, 230 km non stop e sem apoio na travessia da Maior praia do mundo, do Chui até o Cassino.



Fui atras dos recursos necessários conversando com meu patrocinador Cia Athletica e obtive ok, então parti para a periodização dos treinos e durante 5 meses me dediquei de corpo e alma, com 6 treinos na semana incluindo dois treinos longos aos sabados e domingos onde cheguei a fazer 90 km nos dois dias e alguns treinos especificos no nosso litoral norte incluindo noturnos de 40 a 80 km. Defini as estrategias de alimentação, hidratação e equipamentos obrigatórios pois em uma travessia de 230km qualquer erro se tornaria desastroso.


Chegou o dia de partir para o Chui, estava mentalmente e fisicamente preparado para essa prova que saberia que seria extrema. Fui com o José Fernandes da empresa Dunes, o cara é guia turístico naquela região e leva turistas para fazerem a travessia em 6 a 7 dias, e logo que me conheceu já foi falando que aquela região não foi feita para seres humanos habitarem. Chegamos no chui, congresso técnico e drop bags (sacola com nossas roupas e alimentos) para os postos de assistência que seriam nos kms 89, 132, 177, isso mesmo teríamos só essas bases como assistência, em tudo ok.



As 6 h de quinta feira 70 ultramaratonistas partiram com suas mochilas pesadas nas costas, parti em ritmo de 6.15 min/km pois pretendia correr assim até o primeiro posto de controle, o dia estava bom e a temperatura perfeita, em torno de 14 graus, me mantive entre os 10 primeiros e estava me sentindo muito bem, cheguei no primeiro PAS 54 km em 6 lugar, pretendia ficar ali 15 min, almocei, hidratei, cuidei dos pés, enchi minha mochila com 2 litros e mais 1 litro extra e parti para o próximo pas no km 89 , mantive a posição e tudo estava indo muito bem, o corpo estava forte, sem dores e os pés sem bolhas, a calmaria era absoluta naquele deserto infinito e paisagens que geravam muitas reflexões, a solidão era absoluta e absurda, pensava muito na vida e nas pessoas que estavam torcendo por mim e que me ajudaram e estiveram presente em minha caminhada e assim fui até o km 89 onde teriamos que nos preparar para a noite, a parte mais temida do percurso.


Cheguei no Pas as 17h pois o ritmo já havia caido um pouco e o cansaço e desconforto muscular já estavam dando sinais. Fiquei ali 30min para checar pés, alimentar, hidratar e trocar a roupa para enfrentar a noite e o frio. Parti para o próximo posto km132 na 6 posição e sabia que os lideres eram fortes e conhecidos, mas não tinha interesse neles e sim alcançar a meta.


Corri mais 2 horas e começei a alternar com caminhadas rapidas de 500 m, foi quando a escuridão chegou, sabia que ia ser muito dificil pois a escuridão é total e o risco de correr em direçaõ as dunas e o deserto são muitos grandes, não consegui enxergar 10 metros a minha frente e era quase impossivel correr mas me mantive perto da linha do mar e segui confiante até que para minha surpresa começaram a aparecer os clarões no céu.



Ainda estava bem distante do Pas e caminhando levaria horas para chegar lá, mas mantive a calma e segui firme quando avistei uma luz bem distante que foi crescendo e cheguei no quinto colocado, um atleta forte de São Paulo que não estava bem, estava dormindo em pé e desorientado, caminhei um pouco ao lado dele e ele resolveu sentar e parar para descansar um pouco e nesse momento a primeira descarga elétrica e um imensão clarão anunciou o que passariamos naquela noite, começou a chover e ventar muito forte e as condições ficaram terríveis em questão de minutos, sabia que minha prova poderia estar acabando por ali, os ventos e os raios se intensificaram e o medo era muito grande, pois estavamos todos expostos aquela tormenta naquele lugar inospito e extremo.


Minhas alternativas não existiam, era seguir adiante ou me enterrar em um buraco nas dunas e entrar em hipotermia, foi quando começei a rezar para que aqules raios não me acertassem e aos outros atletas. Consegui caminhar a uma velocidade de 3km/h até enxergar a luz do farol que parecia estar perto mas que nunca chegava onde ficava o Pas 132km, enfim com muito medo e destruido pela força que precisei fazer, o frio e a tensão muscular cheguei no Pas onde precisava descansar um pouco e me aquecer e saber noticias dos demais atletas.



Foi quando para minha surpresa era uma barraca do exercito a base de apoio e com ventos de 100km/h e chuva muito forte ela parecia um liquidificador prestes a voar, soldados amarraram no caminhão acho que por isso ela não foi destruida, precisava trocar a roupa e comer e beber pois cheguei no posto sem nada pois levei muito tempo para chegar lá. Fiquei ali durante 3 horas até amanhecer o dia e diminuir a chuva, confesso que não sei se estava mais dificil dentro ou fora dela. 6 horas da manha resolvi partir pois outros 4 atletas já haviam partido e achei que teria condições também.



Quando fui partir chegaram mais 5 atletas incluindo minha atleta Marcia Lima, estavam todos destruidos e apavorados e informando que os demais atletas que ficaram para traz foram retirados da prova devido a falta de segurança e risco de vida, mas nesse momento já estava decidido a partir e sai do Pas quando para minha surpresa os ventos estavam mais fortes e uma tempestade de areia varria aquela terra dos muitos.


Caminhava a 3 km/h fazendo uma força desumana mas mantinha a esperança que aquilo teria que diminuir pois tinha mais 45 km até o p´roximo posto e nessa média levaria mais 15 horas e ficaria sem agua e sem comida e com certeza sem forças para continuar. Minha batalha fisica e mental se deu por mais 6 horas e 20km quando minha urina começou a ficar muito amarela quase vermelha eu sabia que minha prova estava perto do fim, comecei a ficar muito triste pois pensava em desistir e sair daquela tempestade de areia, comecei a rezar novamente para que o caminhão do exercito não passasse pois eu não queria desistir, mas ele infelizmente ou felizmente passou e ali terminou minha prova pois ainda faltavam 60 km e a situação só piorava.



Embarquei no caminhão e o sentimento era de profunda tristeza pois havia me preparado muito para esse desafio e havia perdido a batalha, chegando no limite físico e mental mas ciente que tinha feito o melhor que já fiz e vivido uma grande aventura.


Parabéns aos sobreviventes e concluintes dessa prova que foi extrema, nessa terra de ninguém, onde tudo é muito, nesse abismo horizontal. E cada povo tem a ventania que merece, isso é terra de Gaucho, por isso temos por aqui o nordestão, que levanta muita areia, o minuano que limpa as nuvens do céu mas traz um frio de rachar e o tufão que vem dos Andes e aqui recebe o nome de pampeiro.


 
 
 

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